No passado dia 20 estive nos estúdios da Quantic Dream em Paris, para ver o mais recente projeto dos criadores de Heavy Rain, o muito aguardado Beyond: Two Souls, que se tudo correr bem chegará à PlayStation 3 no próximo mês de Outubro. Ainda há trabalho por fazer e apenas nos mostraram algumas partes do jogo, nem todas estavam disponíveis de forma jogável, nem todas as mecânicas estavam a funcionar perfeitamente, mas o conceito global, ou seja, a personalidade do título estava já escancarada.
A história de Beyond percorrerá a vida de Jodie Holmes ao longo de 15 anos, apresentado para isso 14 modelos animados dela desde os 8 aos 23 anos de idade. O objetivo passa por construir uma relação que vai muito para além da representatividade, querem que o jogador sinta que conhece Jodie intimamente, se preocupe com ela. Não sei quanto tempo é dedicado à fase da infância em comparação já com quando ela é uma jovem adulta, mas o facto de existirem tantos modelos de Jodie, indica que acompanharemos amplamente o crescimento dela.
Mas não são apenas os diferentes modelos a contribuir para tornar a personagem autêntica, estou certo que por esta altura todos terão assistido ao vídeo com a sessão de captura de animações que juntou os atores Ellen Page e Willem Dafoe, onde foram colocados dezenas de esferas espalhadas pela face e corpo dos atores, um tipo de tecnologia apelidada de “Performance capture Technology”.
"A história de Beyond percorrerá a vida de Jodie Holmes ao longo de 15 anos…"
O objetivo passa por tornar cada ação das personagens única durante o jogo. Isto é algo tremendamente ambicioso. Um motor de um jogo conta sempre com um banco de animações a que os developers recorrem durante a produção, por exemplo, quando uma personagem abre uma porta ou sobe um muro o produtor recorre à animação específica para esse efeito, tornando-as muito iguais. Uns jogos apresentam mais variedade do que outros, mas animações únicas é algo que nunca vi, e terei mesmo que esperar para ver neste caso.
A captura de animações através da própria performance do ator será sempre diferente é certo, qualquer ação depende de coisas como o estado de espírito, a postura ou a intenção de quem está a representar e em teoria torna cada momento único e por isso credível. Isto resultou num número recorde de animações para o novo motor de jogo específico para este título, o mesmo utilizado para a tech demo Kara, que já agora, pelo que nos foi dito utiliza já técnicas de efeitos especiais e renderização de próxima geração.
Quem não dependerá tanto de animações mas terá um papel igualmente preponderante na aventura é a figura de Aiden, a entidade que acompanha Jodie desde o dia em que nasceu. Aiden não é dependente da vontade de Jodie, não faz tudo o que ela pede e consegue ser confortante e ao mesmo tempo ciumento e possessivo com ela. Um contraste interessante em termos de “storytelling” é o facto de sendo uma entidade, ele não compreende as regras normais da sociedade e das relações humanas. Não percebe os receios e ânsias que os outros demonstram com a dádiva de Jodie.
Ele estará sim sempre ao seu lado independentemente da situação em que ela se encontre, facto reforçado por podermos alternar o controlo de Jodie e de Aiden a qualquer altura durante o jogo. Como entidade ele não obedece a constrangimentos físicos, quando estamos em controlo de Aiden podemos atravessar paredes para aceder a áreas impossíveis para Jodie, podemos voar, podemos tomar controlo de certos indivíduos mais fracos de espírito e finalmente temos a capacidade de exercer influência sobre a matéria.
O gameplay será assim baseado na cooperação entre os dois, dentro de ambientes bastante mais amplos do que vimos nos jogos anteriores do estúdio, até para reforçar o fator exploração utilizando Aiden principalmente. Mais uma vez existirão várias formas de jogar cada um dos capítulos, ou seja, teremos mais uma vez que fazer escolhas e viver com as consequências. O mais interessante é que estas escolhas não são perceptíveis na maioria dos casos, dependem das nossas ações directas e não de uma caixa de texto de escolha múltipla.
Este sempre foi um dos aspectos do design dos jogos da Quantic Dream que mais admirei, o jogo evita ao máximo dizer ao jogador o que fazer, ou perguntar-lhe que caminho tomar, ao invés, coloca-o na situação onde tem que decidir por si mediante o que vê e o que sente. Para isto acontecer da melhor forma tem que haver um envolvimento emocional muito forte com os acontecimentos, e têm que existir ambientes muito credíveis e detalhados. Os que nos foram mostrados estão sinceramente surpreendente.
"O jogo evita ao máximo dizer ao jogador o que fazer, ou perguntar-lhe que caminho tomar"
A história é como sempre o principal foco de preocupação da Quantic Dream, é dividida por capítulos e é contada em desordem cronológica, ou seja, vamos alternar entre várias etapas da vida de Jodie com partes da história a avançar cronologicamente enquanto outras se movem no sentido oposto, estilo o que vemos no filme “Memento” para quem conhece. Esta técnica de “storytelling” permite-nos aceder às consequências antes das causas, ou seja, torna o enquadramento em resolução e vice-versa, como montar um puzzle.
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