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8) O primeiro encontro

Ela abriu a porta. O cheiro de banho recém tomado e sabonete escapou do ambiente e penetrou refrescante em minhas narinas. Usava um vestido de alças, deixando os ombros e o colo delicado à mostra. Seu rosto estava iluminado pelo sorriso. Pena que assim que me viu, encerrou-o. “Quem ela estava esperando?” – Pensei enquanto a observava abrindo a boca surpresa. Parecia uma repetição da praia e quando começou a levantar a mão, lembrei-me que após tapar um grito saíra correndo tão rápido que nada pude fazer. “Desta vez não!” – Instintivamente segurei seu braço para impedir que fugisse. - Você não vai sair correndo, vai? – E complementei com um sorriso, esperando ser o suficiente para a reter. - Nããão. – Respondeu, parecendo ainda indecisa. - Sou Adriel, seu vizinho. Moro na outra ponta da praia. Antônio pediu-me que lhe desse uma carona. Ele não te avisou? – Expliquei ainda segurando delicadamente seu braço. A pele era macia e quente e não tinha pressa em retirar minha mão. Ela pareceu conf

7) Bem estar

Acordei com o dia já claro. Foi bom dormir bastante. Todo aquele cansaço mental se fora. Estava tranqüila e bem. E com fome, muita fome! Tomei um banho rápido, coloquei um biquíni por baixo de um short e uma regata e fui para a cozinha. Minhas habilidades culinárias eram próximas ao zero. Nem sei como me viraria de agora em diante sem os congelados salvadores da cidade. Felizmente café da manhã não era realmente um bicho de outro mundo. Troquei a toalha da mesa por aquela que comprara e preparei um desjejum farto e bonito que comi com gosto enquanto pensava sobre os últimos acontecimentos. Hoje tudo parecia mais simples. Decidi que não valia a pena quebrar cabeça com asas que somente eu via. Melhor colocar na pastinha dos mistérios insolúveis e deixar lá até que tivesse oportunidade de esclarecer. À noite jantaria com Antônio e esperava conhecer melhor o passado de meu pai. Lembrei-me do medalhão. O que significaria? Qual seria sua origem. Parecia uma jóia elaborada demais para ter sid

6) Tão humano!

Mais tarde decidi ir à vila ver se descobria algo sobre a jovem. Logo que cheguei vi que estava conversando com o proprietário do bar. Aguardei um pouco após sua saída e fui até lá. Disse que a tinha encontrado na praia de manhã sem entrar em detalhes e usando a desculpa da segurança para justificar minha curiosidade. Eles não desconfiavam que a clínica era uma fachada apenas. Antônio contou o que sabia e pude ver que já gostava e se preocupava com a moça. Convidou-me para o jantar de boas vindas que daria a ela amanhã à noite e pediu o favor de trazê-la já que não conhecia a estrada o suficiente para dirigir a noite. Teria recusado normalmente, mas teria sido descortês e aceitei. Não deixava de ser uma boa oportunidade de esclarecer minhas dúvidas. Depois me afastaria de vez deste convívio. “Só desta vez.” – Prometi a mim mesmo. Estava abastecendo antes de voltar quando vi o jeep velho parar atrás do meu e a reconheci ao volante. Fechou os olhos com a cabeça apoiada no encosto como

5) Alucinação persistente

Minha cabeça parou de latejar aos poucos e quando terminaram a limpeza já não doía quase nada. Decidi ir com eles à vila comprar os mantimentos que faltavam e aproveitar para conversar com Antônio sobre meu pai, o verdadeiro motivo de minha presença aqui. Foi confortante ver o sorriso alegre em seu rosto, mas não pudemos conversar direito porque o bar estava lotado com vários turistas que chegaram para a feira de artesanato dos sábados. Convidou-me para jantar em sua casa amanhã à noite e aceitei. Ele milagrosamente me conseguira um jeep alugado, velho mas perfeito para aquelas estradas terroristas. Toda alegre fui passear um pouco antes de voltar para a cabana. Amava estas feirinhas e foi delicioso perceber que a maioria das que se espalhavam pela praça era de artesanato genuíno e não daquelas porcarias fabricadas aos montes que costumava ver na cidade. Comprei uma toalha de tear, colorida e alegre para a mesa da cozinha, algumas plantas e flores, vasos, guardanapos, um sino dos vento

4) Adriel

Aguardei na varanda que ficasse mais claro e a trilha íngreme que levava a praia estivesse visível. Desci então para minha caminhada até a pequena enseada. Estava já há poucos metros quando vi uma mulher sentada em minha pedra habitual. “Talvez uma turista.” – Cogitei, estranhando o inusitado da hora. Eles não costumavam enfrentar a estrada escura para estar aqui ao amanhecer e era por isto que gostava daquele horário. Ao me aproximar vi que era jovem ainda, talvez uns 20 anos, cabelos curtos cacheados, cor de ouro velho. Ocupava metade do espaço que meu corpo na mesma pedra. “Pequena demais!” – Sorri com a comparação. Não querendo assustá-la chutei algumas pequenas pedras para a água e o ruído mínimo foi suficiente para que se virasse em minha direção, com o olhar inicialmente vago e desfocado. Um raio de sol tocou parte dos seus cabelos iluminando seu rosto o suficiente para que visse grandes olhos de um azul intenso, nariz pequeno e fino e boca rosada. "Delicado e proporcional

3) O anjo da morte

Acordei de madrugada em meio ao breu absoluto. Os ruídos apavorantes que ouvia tanto poderiam ser de animais lá fora quanto de monstros aqui dentro. Fechei os olhos em pânico, mas as batidas de meu coração eram ainda mais assustadoras. Lembrei-me que o interruptor estava ao lado da cabeceira e acendi a luz. Mesmo depois de certificar que não havia nenhum monstro sequer embaixo da cama, fiquei ainda quase uma hora encolhida na cama sem coragem de levantar, ouvindo os sons lá fora e imaginando que espécie de feras selvagens habitavam o local. Quando o escuro foi sendo substituído pela claridade resolvi deixar de ser covarde e levantar. Com muito cuidado para não levantar mais pó, retirei algumas roupas, toalhas e objetos de toalete de minha mala e após certificar que o banheiro era usável, agradavelmente surpresa com o jorro farto e quente do chuveiro, tomei um banho demorado. Coloquei um agasalho branco de moletom, meus tênis e retornei à sala. Daria quase tudo o que tinha por um gole d

2) Portal do Sol

Dois dias depois cheguei a Portal do Sol, completamente exausta e amassada depois de ser chacoalhada por horas dentro de um ônibus velho, que me deixou apreensiva de verdade percorrendo a estrada de terra esburacada a uma velocidade impossível. A Estação Rodoviária era uma casa simples, com uma porta, um balcão, um funcionário sonolento e um banheiro que não quis testar apesar da vontade de passar uma água no rosto e um pente nos cabelos. Perguntei pelo Antonio e o atendente indicou-me um bar do outro lado da rua. Apesar do cansaço notei que a rua principal da vila até que tinha seu charme, com vários pequenos negócios ao longo de uma praça bem florida ladeada em ambos os lados por igrejas. “Seriam católicas ambas ou tínhamos aqui uma divergência religiosa a dividir os aldeões?” - Pensei divertida. No bar, Antônio era um senhor de pele curtida do sol, sorriso largo e aberto. Abraçou-me em seu corpo farto como se fosse uma amiga de infância que não visse há anos e extremamente constrang

1) Maise

Olhei a escritura tentando entender seu significado. Estava em nome de meu pai e dizia respeito a uma cabana e algumas poucas terras próximas a uma praia em um local chamado Portal do Sol, do qual nunca ouvira falar e nem mesmo me recordo dele ou de minha mãe terem mencionado. A data da escritura era de dois anos antes de meu nascimento. “Porque meu pai, que odiava o litoral, teria uma casa na praia???” - Busquei novamente entre a pilha de papéis por alguma outra informação que esclarecesse, mas nada. Nem uma foto, nenhuma menção, nada! Apenas aquela escritura, um telefone e um nome anotados no verso. “Papai nunca falou de algum Antonio. Esquisito demais.” - Pensei, sentindo um tênue rastro de esperança nascer. “Talvez, mas só talvez, neste local alguém ainda se lembre dele e consiga mais informações sobre seu passado. Talvez...” - Interrompi o pensamento antes mesmo que formasse, não me permitindo criar ilusões quanto ao encontro de algum parente. Meus pais faleceram juntos em um aci